sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Pecados via Internet

Isaltino Gomes Coelho Filho

Apresentado aos casais da Igreja Batista do Cambuí, em 11 de fevereiro de 2006


Há uma idéia corrente na sociedade de que tudo que é moderno é bom. O conceito de muita gente é que a ciência é a grande libertadora, a grande redentora, e assim, tudo o que ela nos traz é bom. A cultura brasileira recebeu forte influxo do positivismo, que via a ciência como a libertadora da humanidade. Entre nós este conceito, então, é mais forte. Está no nosso imaginário.

Entre as modernidades contemporâneas está a Internet. Ela nos facilita muito a vida, tanto em pesquisas, como em comunicação. Mas há a face oculta dos perigos e da podridão. Podridão mesmo. Este é o termo. Este tema brotou de uma reportagem da revista “Veja” sobre traição virtual. Não li na revista, mas li trechos no site. Não sei se li a reportagem toda, portanto. Mas li as cartas na edição seguinte da revista. Uma mulher se sentiu muito ofendida, e um homem teve problemas sérios para consertar o relacionamento conjugal, depois do envolvimento virtual. A grande ofensa para a mulher é que ela foi trocada por nada. Não foi por uma figura de carne e osso, outra mulher que competisse com ela. Ela poderia se comparar com outra mulher, mas como se comparar com uma figura abstrata? A irritação é compreensível. Quando uma pessoa é comparada com outra ou é trocada por outra, isto é injusto, mas tem base. Mas quando se é trocado por nada, como a pessoa se sente?
O fato de que não há envolvimento físico pode aplacar a consciência da pessoa e lhe dar a idéia de que não está fazendo nada de errado. Mas será que é assim?


1. A QUESTÃO BÁSICA: O QUE É UM RELACIONAMENTO VIRTUAL?

Sucintamente: é um relacionamento entre duas pessoas que não se conhecem, que por vezes estão em cidades e até em estados diferentes, mas que desfrutam de certo grau de intimidade em confidências, palavras, sentimentos e expressões de anseio. Algumas vezes as pessoas usam um nick, um pseudônimo, o que aumenta a sensação de distanciamento pessoal. O que, obviamente, é um equívoco. Há o distanciamento físico, mas não o pessoal, no sentido de ser emocional. Li sobre uma pessoa que estava fazendo terapia porque só conseguia se relacionar virtualmente. Um caso de pessoa bloqueada para relacionamentos reais, com gente de carne e osso, face a face. Só isto é suficiente para se saber que os relacionamentos virtuais são campo propício à expressão de patologias. Os relacionamentos reais também o são, mas os virtuais têm um agravante: o ocultamento da pessoa e o falseamento de sua personalidade real. Quem se relaciona virtualmente, nem sempre sabe quem é a pessoa com quem se envolve. Sabe apenas quem a pessoa tenta aparentar. E nem sempre se apresenta como realmente é, mas como gostaria que a outra pessoa o visse. Lembro de uma charge em que dois cães apareciam teclando em um computador e um dizia ao outro: “O bom da Internet é que ninguém que somos cães”. Na realidade, não se sabe nada de real da pessoa. Muito cão moral se comunica pela Internet.

O relacionamento virtual, do ponto de vista psicológico, pode evidenciar uma dificuldade de adaptação ao mundo real e pode ser uma fuga para um mundo imaginário. Manifesta certa imaturidade e medo de relacionamentos reais, se a pessoa depende exclusivamente deles ou depende muito deles.
No caso da busca de relacionamentos virtuais, daquela pessoa que entra em chats com desconhecidos, o que está em foco não é a Internet em si. É a busca de envolvimento emocional sem comprometimento. Para a pessoa, o que vier é lucro. No fundo, reside em tudo isto a busca de aventura no desconhecido. Aqui, além de aventura no desconhecido, com uma pessoa desconhecida. Um mundo de ilusão.


2. COMO OS PECADOS VIRTUAIS APARECEM

A pessoa entra em um portal, como IG, UOL, Terra, e é convidada para as salas de bate papos. Ela pode escolher o tipo de assunto e a faixa etária. Aí, é aquela pasmaceira de generalidade e abstrações. Mas há salas sobre sexo, e nas quais se podem trocar até fotos e marcar encontros. Qualquer pessoa medianamente informada sabe que é perigoso se abrir com desconhecidos e marcar encontros com tais pessoas. Vez por outra lemos de casos de violência até mesmo com morte, de encontros assim marcados.

Há os chamados torpedos. Não são Internet, mas seguem a mesma linha. Um dia desses recebi mensagem da empresa da qual tenho celular dizendo que tiraria meu nome de não sei exatamente o quê, acho que de uma lista para namoros, pois havia seis meses que eu não mandava torpedos. Num país com regras mais definidas e leis obedecidas, eu poderia abrir um processo contra a empresa. Nunca me inscrevi para conversar com desconhecidos nem pedi que alguém fizesse isso por mim. No meu cadastro consta que sou casado. Não seria difícil encontrar um advogado que me orientasse. Ou querem me obrigar a ter um caso ou querem me forçar a relacionar-me com pessoas estranhas. E é uma violação de minha privacidade, dar meu número para desconhecidos me ligarem.

Os torpedos são mensagens que se enviam para desconhecidos. Há os que se enviam para conhecidos, sem que estes queiram, com propostas que eles não querem. Uma jovem se queixava das insinuações que um homem casado lhe fazia, enviando-lhe torpedos. Alguns em linguagem que ninguém poderia dizer coisa alguma, mas que ela sabia ter duplo sentido. Havia alguns bem claros, como declarações de amor. A pessoa não tem coragem de falar frente a frente e fala eletronicamente. Ou se insinua e recua, caso não obtenha sucesso, ou vai em frente, caso veja o sinal verde. Mas em qualquer caso, age com má fé e dolo. É, desculpando o termo grosseiro, uma “cantada”, algo que um homem casado não deveria passar em uma outra mulher, principalmente sendo os dois crentes em Jesus.
Temos um caso de desonestidade, e até mesmo de violência. Porque a pessoa entra no espaço particular de outra, sua caixa de correspondência eletrônica, ou seu celular, com uma mensagem que a pessoa não quer. Isto é pior que um spam. É uma agressão ao direito da pessoa em não querer se envolver com outra. Isto também é um relacionamento virtual.

O pecado virtual já começa com boa dose de mentira. Ninguém diz: “Sou baixinho, careca, pernas tortas”. Apresenta-se como sarado, tipo Rambo. Ninguém diz: “Sou tão feio que até minha mãe relutou em aceitar”, mas procura apresentar-se como um Brad Pitt ou como uma Luiza Brunet. Vai-se para um relacionamento em que a verdade sobre si é omitida e só partes fantasiosas que se deseja exaltar para impressionar são apresentadas. Um mundo irreal. Pessoas sadias aceitam-se como são e não precisam mentir a seu próprio respeito. Pessoas sadias têm relacionamentos reais com pessoas reais.


3. A QUESTÃO DA PORNOGRAFIA

Há um outro aspecto, no mundo da Internet: a busca de pornografia. Os sites pornográficos são os mais acessados e rendem uma fortuna aos seus donos. Junto com a pornografia vem a pedofilia. A pedofilia floresce por causa da liberdade da pornografia. A Internet, neste sentido, é fonte de lixo. Reportagem do Estadão, 7 de fevereiro de 2006, traz uma reportagem sobre o Orkut e como a pedofilia é explorada em seu ambiente. Um pedófilo, inclusive, se orgulhava de que nunca seria descoberto. Também lemos, nesta semana, sobre uma quadrilha desbaratada, que traficava cocaína pela Internet. Bem, deixemos isto de lado. Traficar se faz em qualquer meio. Mas é para mostrar que há certa ingenuidade de presumir que todo avanço tecnológico é bom. Por trás do avanço tecnológico está um usuário humano. Havendo um usuário humano haverá a presença do pecado. “De fato, tenho sido mau desde que nasci; tenho sido pecador desde o dia em que fui concebido” (Sl 51.5). O homem é um rei Midas às avessas. Tudo que Midas tocava virava ouro. Tudo que o homem toca é estragado pelo pecado. A Internet é um desses casos. E a pornografia é o exemplo mais forte.

A pornografia é um caso sério e complexo. É uma doença moral e psicológica. É perversão de um sentimento divino, o amor sexual. Ela se torna um vício muito forte por mexer com instintos primários. Quando uma pessoa busca pornografia, já decidiu que vai se prostituir ou prevaricar ou adulterar. Ainda não decidiu com quem e não lhe veio a oportunidade. Mas já desceu ao nível instintual.

A pornografia tomou grande impulso com a coisificação do homem e da mulher, com o rebaixamento do sexo do nível do amor para o nível do instinto, e para o aviltamento das relações humanas. Numa sociedade em que o homem foi reduzido a animal, não é de se estranhar que isto aconteça. Vivendo sob instintos, a pessoa procura o sexo por instinto, não por afeto e ternura. Há casais que buscam a pornografia, juntos, na rede. Outros há que alugam filmes pornográficos. Um homem argumentou, certa vez, que fazia isto para apimentar seu casamento. Ele devia estar se tornando impotente, ou a mulher tornando-se desinteressada, ou o casamento ia muito mal. Se um casal precisa de pornografia para se desejar, o casamento está mal. Não há amor e os dois precisam de estímulos. Como sexo e amor não são a mesma coisa, quem precisa de estímulo sexual, se não tem um problema fisiológico ou orgânico, está com problemas emocionais ou morais. Ou, mais facilmente, não ama. Onde há amor genuíno não haverá pornografia. Ela avilta a pessoa e a torna inapreciável. Uma vez vi num caminhão: “Não existe mulher feia. É você que não bebeu bastante”. “Não existe parceiro desinteressante ou estimulante. É você que não se drogou pornograficamente o suficiente”, pode-se dizer, na mesma toada.

A busca de sexo na Internet é problemática. Mostra uma dificuldade psicológica séria: o desejo sexual foi esvaziado de amor. Quem busca erotismo na Internet desperta os seus instintos, mas adoece psicologicamente. E maltrata o casamento. Se a única maneira de desejar o cônjuge é através da pornografia, a coisa vai mal. O melhor estímulo é a manutenção do romance, da continuidade do relacionamento amoroso, gentil e respeitoso. Quem é desejado por causa de pornografia, não é amado. É coisificado.

Não use a Internet em busca de aventuras ou em busca de pornografia. Se você usa, está com problemas. Alguém me disse que isto é normal, tão normal como a fome. Ora, se uma pessoa está com fome, e a única maneira de fazê-la comer é cobrindo os pratos com véus, tocando música sensual, descobrindo os pratos devagarinho, com luzes sobre eles, a pessoa tem problemas sérios. Se a única maneira de despertar interesse sexual é desta maneira, algo está errado.


4. POR QUE ISTO ACONTECE?

Por que acontece isto, de pessoas buscarem pornografia e aventuras sexuais pela rede?

Primeiro, porque é pecador, perverte as boas coisas. Li que a energia nuclear poderia fazer com que se plantasse num dia e se colhesse em outro. Mas a energia nuclear nos trouxe o fantasma da destruição final. O álcool é medicinal e carburante, mas pode ser usado para embriaguez. A pessoa perverte os bons dons divinos e as boas descobertas humanas. Não é a coisa em si, mas o uso que fazemos dela. Lembre-se que você é um pecador, mas é um pecador salvo, regenerado pelo sangue de Cristo. Evite rebaixar-se. Evite aprisionar-se. “Cristo nos libertou para que nós sejamos realmente livres. Por isso, continuem firmes como pessoas livres e não se tornem escravos novamente.” (Gl 5.1, BLH) pode se aplicar aqui, sem violentar o texto.

Segundo, porque a pessoa perdeu noção de balizas. Quem é cristão não o será apenas nos cultos nem somente em público, mas em todas as áreas da vida. Devemos lembrar do Salmo 101.3: “Não porei coisa torpe diante dos meus olhos” (VR). Cabe aqui o cântico infantil: “Cuidado, olhinho, com o que olha”. Se Davi tivesse se portado com classe, com educação, e desviasse os olhos quando viu Bate-Seba se banhando, teria evitado muitos problemas. Uma mulher se banhar não é torpe, mas olhá-la ocultamente é. Cuidado com o olhar indevido.

Terceiro, por uma limitação teológica. “Ninguém está vendo”, pensa a pessoa. Deus está vendo. Nossa conduta deve ser por causa dele.
Quarto, por imaturidade. A pessoa idealiza um cenário, para se estimular. Mas isto exige muita dose de devaneio, de imaginação, de fuga do real. Fantasias podem ajudar, mas se a pessoa se refugia sempre na fantasia, é imatura.

Mais questões poderiam ser aventadas aqui, mas corremos o risco de repetição, pois muitas delas se tangenciam. No entanto, uma pode ser levantada: falta a mente cristã. Falta pensar como um cristão. E como um cristão pensa, perguntaria alguém? Há um cérebro diferente, quando a pessoa se converte? Não, o cérebro é o mesmo, mas o universo de valores deve mudar. Lembremos do texto de Paulo aos colossenses: “Vocês foram ressuscitados com Cristo. Portanto, ponham o seu interesse nas coisas que são do céu, onde Cristo está sentado ao lado direito de Deus. Pensem nas coisas lá do alto e não nas que são aqui da terra. Porque vocês já morreram, e a vida de vocês está escondida com Cristo, que está unido com Deus. Cristo é a verdadeira vida de vocês, e, quando ele aparecer, vocês aparecerão com ele e tomarão parte na sua glória. Portanto, matem os desejos deste mundo que agem em vocês, isto é, a imoralidade sexual, a indecência, as paixões más, os maus desejos e a cobiça, porque a cobiça é um tipo de idolatria. Pois é por causa dessas coisas que o castigo de Deus cairá sobre os que não lhe obedecem. Antigamente a vida de vocês era dominada por esses desejos, e vocês viviam de acordo com eles. Mas agora livrem-se de tudo isto: da raiva, da paixão e dos sentimentos de ódio. E que não saia da boca de vocês nenhum insulto e nenhuma conversa indecente. Não mintam uns para os outros, pois vocês já deixaram de lado a natureza velha com os seus costumes e se vestiram com uma nova natureza. Essa natureza é a nova pessoa que Deus, o seu criador, está sempre renovando para que ela se torne parecida com ele, a fim de fazer com que vocês o conheçam completamente.” (Cl 3.1-10, BLH).

CONCLUSÃO

Evite usar a Internet para defraudar os outros, mentindo, insinuando-se, forjando situações que você sabe que não são corretas. Evite despir-se da condição de cristão e deixar-se dominar pelos instintos. Lembre-se que a pornografia é uma droga emocional e psíquica, e que livrar-se dela exigirá muito. Lembre-se, acima de tudo, que ao sentar-se diante de um computador você continua sendo um cristão.
O computador é moderno. A Internet é moderna. A cruz é antiga. Mas a cruz deve balizar o uso do computador. Não tenha a mente do mundo. Tenha a mente da cruz.

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