terça-feira, 23 de março de 2010

SOU LEGALISTA, MAS QUERO MUDAR




Pr. Israel Belo de Azevedo



Jonas era perfeccionista. Quando descansou para ver o que tinha feito, ficou triste, porque as coisas saíram do seu controle: que absurdo! O povo de Nínive se converteu...



Jonas tinha um alto senso crítico, inclusive em relação ao si mesmo. Quando o problema no barco surgiu, ele não teve dificuldade de perceber onde estava o problema. Ele era o problema. Mas ele se perdoava, porque o problema maior era o povo a quem foi enviado ou era o Deus que o enviara.





Jonas vivia comparando. Ele olhou para a história do seu povo e viu um povo eleito e merecedor de amor. Olhou para os assírios e viu um povo que não merecia uma chance de ouvir uma boa notícia.

Jonas era arrogante. O Jonas que ora no ventre no peixe não é o Jonas verdadeiro; o verdadeiro era aquele que se achava portador da verdade: com que prazer ele pregou: vocês vão morrer se não se arrependerem. E ele estava certo, em sua arrogância, que o povo não arrependeria. Como todo legalista, Jonas achava que sabia mais que Deus.



Jonas era intolerante. Os assírios tinham que ser varridos do mapa; sua maldade tinha chegado aos céus. Jonas tinham um ódio "santo" daquele povo.





Jonas era fanático. Ele sua via o que queria: um povo que merecia morrer, nunca viver. Quando foi pregar, tinha certeza que não haveria nenhuma conversão.



Jonas era hipócrita. Ele não queria entrar na história como alguém que pregou a um povo que não merecia. Ele não queria sujar o nome do seu seminário, com uma mensagem tão fora dos padrões. O que Deus lhe pediu era uma obra menor; ele não queria ser conhecido como o profeta que pregou aos opressores. Ele tinha um nome a zelar.



O maior problema de Jonas, no entanto, era sua teologia.



Ela nos ajuda a entender a de muitos de nós, que tendemos ao legalismo.



1. O legalista até ouve a voz do Senhor.

Quando Deus chamou Jonas para pregar aos ninivitas, ele o ouviu. O problema do legalista não é ouvir; é obedecer. O legalista, portanto, até ouve a Palavra de Deus, mas não consegue obedecê-la, porque se coloca como o chicote de Deus para os homens (Jonas 1.1-3).



2. O legalista até crê na graça, mas não admite que ela alcance os de fora da sua lista.

Para Jonas, Deus não podia derramar graça sobre os ninivitas. Segundo o relato bíblico, viu Deus o que fizeram, como se converteram do seu mau caminho; e Deus se arrependeu do mal que tinha dito lhes faria e não o fez. Com isso, desgostou-se Jonas extremamente e ficou irado (Jonas 3.10; 4.1)

A salvação de Nínive não cabia no compêndio teológico de Jonas. A tradição teológica do seu povo, à qual Jonas era fiel, não comportava o horizonte da conversão de um povo opressor.



3. O legalista até ora sinceramente, porque sabe que Deus é bom.

Jonas orou ao Senhor e disse: Ah! Senhor! Não foi isso o que eu disse, estando ainda na minha terra? Por isso, me adiantei, fugindo para Társis, pois sabia que és Deus clemente, e misericordioso, e tardio em irar-se, e grande em irar-se, e que te arrependes do mal (Jonas 4.2).



PARA MUDAR

Os resultados do legalismo são culpa, vergonha, ressentimento e esgotamento.



1. Precisamos de uma boa teologia acerca da graça, que nos lembre que o legalismo é contrário ao evangelho cristão, porque esta na contramão da graça dinâmica de Deus em Jesus Cristo.

O Cristianismo não é uma religião baseada na lei.



O legalismo não nos salva e nem nos santifica. O legalismo é a base de uma religião que cega as pessoas e as mantém escravas a regras, a regulamentos, a rituais e ao esforço próprio. O legalismo é pecado, porque valoriza as obras da carne e incita ao pecado, em lugar de nos ajudar a evita.



O legalismo é idolátrico, ao colocar um padrão de lei independente baseado na justiça própria e não na justificação divina.

Ele é contrário à fé, que é a nossa resposta à ação de Deus. É contrário ao senhorio de Jesus, que é Quem dirige e guia nossas vidas. É contrário a uma vida cristã guiada pelo Espírito Santo, que nos capacita e fortalece (Efésios 5.8).



É contrário à obediência cristã, que se realiza em ouvir a direção do Senhor Jesus. É contrário à liberdade em Cristo, liberdade que alcançará, sabemos, sua plena realização no Reino por vir (João 8.31,32,36; 2Coríntios 3.17; Gálatas 5.1,17).



Por isto, o legalismo não é para ser tolerado; ao contrário, deve ser exposto para ser evitado (Gálatas16-9).



2. Precisamos de uma boa perspectiva do que seja a vida, que nos lembre que o legalismo mantém as pessoas distanciadas e alienadas de Deus.

Isto não quer dizer que jamais defenderemos nossos pontos de vista e jamais lutaremos para vê em prática e jamais confrontaremos o erro, teológico ou moral.

É claro que precisamos lutar pela fé e pelos valores bíblicos.



A graça não pode ser um salvo-conduto para a libertinagem, tanto teológica quanto moral. Sobre isto nos adverte Judas: Amados, embora estivesse muito ansioso por lhes escrever acerca da salvação que compartilhamos, senti que era necessário escrever-lhes insistindo que batalhassem pela fé de uma vez por todas confiada aos santos. Pois certos homens, cuja condenação já estava sentenciada há muito tempo, infiltraram-se dissimuladamente no meio de vocês. Estes são ímpios e transformam a graça de nosso Deus em libertinagem e negam Jesus Cristo, nosso único Soberano e Senhor (Judas 3-4).

Muitos confundem a defesa da verdade com legalismo, de que tipo seja. A verdade pode ser defendida sem que se precise atacar àquele cuja idéia se quer combater. Por ocasião das tsunami de 26 de dezembro de 2004, um pastor escreveu um artigo em que perguntava, desesperado, onde estava Deus naquela situação; ele propunha que nossos conceitos acerca de Deus precisavam ser revistos. A posição do autor, ao meu ver, estava equivocada, mas um crítico, em lugar de apenas criticar sua teologia, perguntou impiedosa e legalisticamente, num artigo, algo como: "quem quer ser pastoreado por um homem desses?".

Surgirão situações em que teremos que confrontar idéias e comportamentos. Jesus confrontava, mas como exceção, não como regra.

Muitos se esquecem que também falham. Conta-se que um amigo disse a John Wesley:

-- Eu nunca perdôo.

Ao que Wesley respondeu:

-- Espero que você nunca peque.



Não nos deixemos levar pelo legalista. Quando estamos cercados dele, tendemos a cair na sua rede. Recordemo-nos sempre das palavras do apóstolo Paulo: Portanto, você, por que julga seu irmão? E por que despreza seu irmão? Pois todos compareceremos diante do tribunal de Deus (Romanos 14.10).



3. Precisamos de um compromisso que nos leve à mudança.

A história de Jonas nos ajuda neste compromisso.



. Tenhamos sempre diante de nós Quem Deus é. Embora pusilânime, Jonas sabia o Deus fizera fez o mar e a terra (Jonas 1.9). Ele sabia que saíra da presença de Deus, mas que voltaria, por causa da graça. (Jonas 2.4). Jonas não alcançou o que agora podemos alcançar, tendo a Bíblia toda ao nosso dispor: Deus é perdoador, bondoso e misericordioso, muito paciente e cheio de amor. E que por isto, jamais nos os abandona (Neemias 9.17).

Que as nossas vidas sejam um tributo a um Deus que compassivo e misericordioso, muito paciente, rico em amor e em fidelidade (Salmo 86.15). Tremamos diante da verdade, dita pelo próprio Criador: eu, o Senhor, o teu Deus, sou Deus zeloso, que castigo os filhos pelo pecado de seus pais até a terceira e quarta geração daqueles que me desprezam. E nos alegremos com o mesmo Pai Eterno que nos garante: mas trato com bondade até mil gerações os que me amam e obedecem aos meus mandamentos (Deuteronômio 5.9-10). Por que ficarmos apenas na primeira parte da verdade bíblica, como fazem os legalistas? Que o nosso Deus seja Aquele revelado em Jesus Cristo.



. Reconheçamos, como o Jonas do ventre do peixe, que "a salvação vem do Senhor" (Jonas 2.9), não de nossa pureza, de nosso esforço, de nossas ações, de nossa obediência à lei, seja ela qual for.



. Estejamos dispostos a responder à pergunta de Deus a Jonas:



"Você tem alguma razão para essa fúria?" ou, segunda outra versão, "



é razoável essa tua ira?"